Enjoy the Silence

by - terça-feira, março 10, 2009



"Vows are spoken to be broken
Feelings are intense
Words are trivial
Pleasure remain, So does the pain
Words are meaningless, And forgetabble (...)
Words are very unnecessary, They can only do harm."


Depeche Mode - Enjoy the Silence
in Violator (1990)


O silêncio diz, fala, mexe, provoca.
Mais do que tudo o que se possa dizer, emitir, julgar ou fazer.
O silêncio fala-nos por canais iluminados de sentidos que julgamos adormecidos.
Grita. Ensurdece e cala. Acorda, abana, provoca tempestades e maremotos.
As palavras que não são ditas através da voz. Os sons que não são transmitidos através das partículas do ar. Tudo o que vem dentro de um olhar. Tudas as sensãções transmitidas através de um trejeito. Um sorriso. Uma lágrima. E o silêncio. Revigorado, novo, essencial, ascendente. Podemos apanhar-lhe a cauda, e viajar, como um cometa, através do silêncio.
Porque as palavras, quando as erradas, podem magoar. Porque, quando sopradas, podem ficar perdidas num tempo e num espaço, presas, esquecidas, imóveis. Porque, quando não são sentidas, enganam. Porque, porque, porque, passam.
Porque todas as sensações expressas no silêncio de um beijo, de um olhar, de um toque, ficam.
Porque.
O silêncio diz, fala, mexe, provoca.

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4 comentários

  1. Há música no silêncio. É só ter atenção.

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  2. Muito fixe. :)
    Como escrevi algures no final duma cena minha:

    "Dói ouvir...
    Dói mais ainda perceber e sentir.

    O silêncio, tão nu e fácil ...
    Pode querer dizer muito mais. "

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  3. 1/2

    Chocamos de novo nas nossas ideias. Desta vez chocamos na avaliação das palavras ditas e também na avaliação dos poderes comunicativos e reveladores do silêncio e daquilo que por meio dele é posto em relevo e partilhado: os nossos sentimentos. A tua perspectiva é tal que fez nascer em mim a necessidade de cantar um elogio às palavras. Não digo que as tenhas desprezado por completo, mas acho que as menosprezaste - e era isso que eu queria tentar corrigir, até porque, caso algum não-humano esteja a ler o teu blog, acho que ele ficaria com uma ideia injusta do que são ou podem ser as palavras na realidade humana.

    Comecemos por ver os sentimentos em geral. Há sentimentos bons, sentimentos maus, sentimentos mistos, talvez até sentimentos indiferentes. Dificilmente elogiaríamos todos. Os maus só são elogiáveis se houver também os bons e estes de alguma forma predominarem. Imagino que ninguém elogiaria uma vida da mais profunda e selvagem angústia. Com isto quero apenas dizer que, se por um lado o não termos uma relação apática e abstracta com a vida é algo bom, por outro lado há sentimentos e sentimentos.

    Da mesma maneira, há palavras e palavras, isto é, há diferentes usos e vivência do uso da palavra. Há a palavra quotidiana, que é uma espécie de cartaz que levantamos para simplificar o que sentimos e as situações por que passamos, muitas vezes com uma finalidade prática, para obter algo de outrem ou para que o outro saiba como agir. No entanto, há também palavra poética e há ainda aquilo a que chamaria a palavra reflexiva. Nestes casos, falar é agir, é construir-nos e construir mundo. Aí falar é também acção sobre o outro, é partilhar com ele um dinamismo, uma tensão, uma mobilidade de olhar. E neste caso não tem de se estar sempre a falar, a dizer coisas novas, mas se deixarmos as palavras atingir um certo peso na nossa vida e nos esforçarmos por elas, então há um ecoar do diálogo, seja ele interno ou externo. Isto não quer dizer que fiquem sempre as mesmas palavras a ecoar, mas elas são veículos daquilo que verdadeiramente fica a ecoar em nós: as compreensões, os olhares sobre as coisas, as complexas intuições, até mesmo os complexos sentimentos, articulados entre si - e articulados de modo a estarem presentes de forma mais clara, pois o conseguir explicar ou falar sobre algo traz luz, traz determinação, traz contornos. O falar só mata ou asfixia a realidade em causa se nos contentarmos com uma única formulação de algo, se não procurarmos rever isso de múltiplas perspectivas, completá-lo pela diferença. Todas as histórias que nos fazem têm de estar sempre a ser contadas, para não serem asfixiadas. A palavra tem de renovar e de se renovar. Ela é um agente de vida e permite que tudo continue a desenvolver-se, cada vez mais apropriado, mais integrado no sentido que nós somos.

    Protréptico

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  4. 2/2

    Os sentimentos, pelo contrário, são trevas pseudo-evidentes. Nós recordamo-nos deles, mas recordamo-nos de algo abstracto. A sua determinação principal é a intensidade. Lembramo-nos do pretexto que o causou e relacionamo-lo com a intensidade e julgamos ter clareza. Mas perdemos de vista que tem de haver um olhar para a vida, uma interpretação do que está em causa nela, tem de haver pensamentos (mesmo que subterrâneos, implícitos) para sentirmos. Estes abrem o horizonte no qual os sentimentos decorrem. Nesse sentido, os sentimentos são confusos - facilmente neutralizam as suas dimensões mais importantes, que os possibilitaram e os animaram. A palavra, pelo contrário, remete para isso, para o esforço de uma compreensão mais profunda. Abre-nos para algo mais. Os sentimentos fecham-nos em si, enfeitiçados, absorvidos, obcecados. São um transe que nos adormecem e viciam. Impedem o aprofundamento da nossa identidade - isto se não tivermos o cuidado de nos guiarmos pela reflexão, que alarga o nosso horizonte e que pode transformar e integrar os sentimentos na nossa história, na nossa busca de um aprofundamento do sentimento e da transparência relativamente a nós próprios. As palavras dão uma plataforma segura na qual nos podemos esforçar por nos apropriar cada vez mais da nossa vida e de toda a sua realidade. Sem palavras facilmente nos perdemos nos turbilhões intensos que desviam o nosso olhar de nós mesmos (e diria mais, nos desviam também dos outros, porque a comunidade de sentimentos é uma comunidade assente num fechamento de ambos a algo que sentem, a algo privado e altamente simples, na sua intensidade - a palavra, pelo contrário, é intrinsecamente partilhadora, anseia ser escutada, percebida e respondida, e nessa medida anseia também escutar).

    Eu amo a palavra, a palavra reflexiva. Para mim é ela que verdadeiramente fala, mexe, provoca. O silêncio, pelo contrário, é uma aceitação e consagração aos sentimentos, à sua confusão, assente na sua intensidade distinta. É um entorpecimento pelo excesso, tanto mais perigoso por aparecer como despertez. Tudo isto quando apenas a palavra nos pode acordar para as dimensões mais profundas de nós mesmos, para a identidade narrativa altamente complexa que temos a cada momento de construir, para conseguir dar ou criar o sentido que a vida e o nosso mundo exigem de nós, umas vezes de forma mais paciente, outras mais agressiva. A palavra é princípio, meio e fim dessa construção, isso porque ela não fecha em si, mas reconstrói (ou pode reconstruir) a partir de si o mundo - como as tuas reflexões por vezes parecem fazer, ainda que timidamente. Mas esta timidez é algo que todos nós partilhamos. O caminho da palavra é um caminho árduo. É uma tarefa para a vida - é a tarefa da vida, diria. Sentir, não sendo nada despiciendo e extremamente importante, deve ser integrado na nossa vida a partir dessa tarefa e como algo que possibilite incrementar a nossa execução da mesma. Sentimos para pensar. E, na verdade, quando assim é e o pensamento se aprofunda, então o próprio pensar é sentir e resulta num sentir, mas num sentir já não confuso, num sentir mais transparente, mais vasto - talvez não tão intenso, porque isso implica sempre um certo torpor, mas sem dúvida mais extenso e mais gratificante, porque mais adequado à nossa natureza e ao nosso destino.

    Acho que é importante que o nosso leitor não-humano, eventualmente extraterrestre, tenha noção disto. Nós somos tais que a palavra também pode ter este papel fundamental na nossa vida.

    Protréptico

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